Em Ébano, Ryszard Kapuscinski termina a sua nota introdutória com o seguinte aviso: É apenas por uma questão de simplicidade e comodidade que falamos de “África”. De facto, essa África não existe sequer, a não ser como conceito geográfico. Esta foi a minha primeira lição quando visitei o continente pela primeira vez. A palavra África era uma invenção que escondia algo maior que a compreensão. Mesmo esse “conceito geográfico”, esse limite no qual o espaço se podia estender, guardava dentro de si o Infinito.
Acabava de chegar ao Uganda. Subitamente, tudo me pareceu imensuravelmente grande. O céu, a savana e a floresta não cabiam no olhar. Tinha de mover a cabeça através do horizonte para obter uma paisagem. Vendo o cume de uma árvore, espreitava também as estrelas. As distâncias eram esmagadoras, reduzindo-me com a sua imensidão. A sua História não me coube na memória. As pessoas aumentavam a minha concepção de Humanidade. Paragens, esperas, incertezas. Todas fabulosas, por não terem princípio nem fim e, assim, encherem o espaço de eternidade. Este é um sentimento que não passa. Uma doença sem cura. De todas as vezes que cheguei a um país africano, senti-me pequeno.

Praia paradisíaca na Guiné-Bissau.
O aparente tamanho de África (enquanto conceito geográfico) é fruto de uma ilusão que nos é transmitida desde novos e que nós, viajantes, que a olhamos diariamente para ela, perpetuamos: o Mapa Mundo. Na projeção de Mercator (utilizada nos nossos mapas bidimensionais) África parece um continente pequeno. Ou pelo menos tão grande como a Gronelândia ou o Canadá. Mas isto não passa de um engano, criado pela tentativa de fazer de uma esfera um plano. Para manter as formas, prescindimos do tamanho real, e quanto mais uma figura se aproxima dos pólos, mais se deforma. Então, África parece pequena, em comparação a outros continentes.
Na realidade, África é um lugar imenso. Atravessa 6 fusos horários. Estende-se desde os “portões” da Europa, cruzando o Trópico de Cancer, o Equador e o Trópico de Capricórnio. É um universo com cerca de 30 milhões de km2 (mais de 20% da massa terrestre) onde habitam 1.3 milhões de pessoas, de 3000 grupos étnicos, falando 2100 línguas, distribuídas por cerca de 54 países. São números demasiado grandes que deformamos, comprimimos, empilhamos dentro da palavra África.

Vida na ilha de Bubaque, arquipélago dos Bijagós, Guiné-Bissau.
Dizer África é o mesmo que dizer Cosmos. Não fomos feitos para compreender o Infinito e temos problemas com números que se estendam para além da nossa imaginação. Então criamos figuras. Surgem-nos imagens. De um lado: Planetas, Estrelas, Quasares, Nebulosas e buracos negros; do outro: Kilimanjaro, Elefantes, Lucy e os primeiros humanos, Masais, Coração de Trevas e Colonialismo. Dizemos Cosmos, mas falta-nos apreender os pilares do Universo. As leis que o regem e que fazem com que o espaço se dilate; que o tempo corra, coxeie ou se arraste dependendo da velocidade a que nos deslocamos; que há 3,28×1080 partículas no universo (isto é 328 com 78 zeros à direita); e que cada uma delas segue uma coreografia dirigida por forças invisíveis que criam tudo aquilo que existe. Dizemos África, mas falta-nos compreendê-la.
Não pretendo aqui explicar África. Como disse Kapuscinski, ela nem existe. Mesmo que tentasse explicar a plenitude das forças em ação, o vasto catálogo de microcosmos em ebulição, o emaranhado de ligações, cosmologias e significados em mutação, seria uma tarefa simplesmente dantesca. Em vez disso, contarei 3 histórias que seguem leis, teorias e princípios científicos. Estas regras e diretrizes ajudam-nos hoje a compreender e explicar o Universo, através de eventos particulares. De alguma forma, estas entrelaçam-se também com as minhas histórias. Tentando aplicar essas leis Universais ao contexto africano, espero apenas poder desvendar pedaços do infinito do continente que nos preenche o imaginário. Penso que esta é a única maneira de fazer justiça a África.
Aventura-te e ruma ao desconhecido com a The Wanderlust!
Todas as fotografias são da autoria de Wilson Vieira