Depois de um ano que trocou as voltas a muita gente, que me forçou a alterar todos os meus planos, encontro-me em Lanzarote. Tinha em mente uma viagem de alguns meses e acabei por atravessar o mundo a navegar num veleiro.
Tudo começou em Janeiro de 2020, quando viajei até à Nova Zelândia para realizar o desejo de fazer a travessia até às ilhas do Pacífico, mais especificamente à Polinésia Francesa. Teria de esperar até Maio para realizar a travessia, esta é a altura ideal devido ao final da época dos ciclones. Por isso, procurei ganhar alguma experiência, com uma família neozelandesa, que tencionava também velejar até às Fiji, Tonga e Vanuatu.
Em Março, enquanto viajávamos pela ilha do Norte da Nova Zelândia, fizemos uma paragem na marina em Tauranga. Foi aqui que me deparei com um veleiro diferente de todos aqueles que normalmente vejo e me chamou a atenção pelas suas características únicas. Robusto, inspirador e de confiança em passagens seguras e confortáveis, construído especificamente para travessias na Antártida. O meu sexto sentido anunciou que não era a última vez que navegávamos as mesmas águas.
Entretanto, meteu-se uma das medidas mais fortes contra um vírus. Foi declarado um ‘lockdown’ que durou mais de 3 meses, encerrando totalmente o País e as fronteiras das ilhas do Pacífico. O risco de não vir a realizar o meu sonho, as incertezas e as consequências desta pandemia começaram a pairar na minha cabeça como uma frente fria e o instinto pedia-me para procurar alternativas.
Em Junho de 2020, atendendo ao facto de estas ilhas ainda não estarem abertas a turistas, a dificuldade de arranjar trabalho (a prioridade é dada aos residentes), o aproximar da estação dos ciclones no Pacífico e o risco de ser apanhada numa segunda vaga de COVID-19 em países de sistema de saúde precária, tomei uma decisão radical.
Perdido por 10, perdido por 18 mil léguas. Decidi tornar estas incertezas e notícias menos auspiciosas em vento de popa: o sonho de velejar até às ilhas do Pacífico era agora ‘para meninos’. Bom mesmo seria regressar a casa (Portugal) a velejar e atravessar meio mundo. Fiz então o que na altura me pareceu a forma mais fácil de fazer este sonho – muito improvável – acontecer: publiquei um post numa página de Facebook (Sailing Worldwide) onde se procuram e oferecem viagens em veleiros em torno do Mundo.
Questionei se alguém iria em breve para a Europa, partindo da Nova Zelândia e que me pudesse dar boleia até aos Açores. Em menos de um dia, fui contactada por um capitão norueguês, dono de um veleiro Bóreal de 14m, que também desistiu do sonho de rumar até à Antártida, para regressar à Suécia. Por coincidência, foi exactamente o capitão do mesmo barco que quatro meses antes tinha visto em Tauranga.
Fiquei extasiada ao saber que o tiro no escuro atingiu o alvo, especialmente numa altura em que ninguém tem a coragem de se sujeitar a grandes aventuras. Um encontro para um café para me colocar a par de todos os detalhes e paragens desta viagem foi o suficiente para me convencer a saltar a bordo e cair de amores pelo capitão viking dos olhos azuis.
A despedida de terra foi bastante emocionante, apenas nesse momento senti o choque da realidade. Dei-me conta da aventura que estava prestes a viver. Grande parte dos velejadores da marina em Opua vieram despedir-se de nós e desejar- nos boa sorte. Foi uma sensação única ver todas aquelas famílias e velejadores ali para nos saudar.
Entretanto, a nossa aventura já está quase a terminar. Partimos de Opua (Nova Zelândia) e parámos em Darwin (Austrália), Le Port (Ilha da Reunião), Richard’s Bay, Port Elizabeth e Cape Town (África do Sul).
Até ao momento, a costa sul africana foi a parte mais desafiante desta viagem. Isto deve-se ao facto de o vento em direções oposta à corrente puder provocar ondas que chegam até aos 30m. Todas as navegações tiveram que ser meticulosamente planeadas e só saímos em condições atmosféricas ideais.
Estou nesta altura nas Ilhas Canárias, depois de 4 semanas a navegar desde a remota Ilha de Santa Helena. O nosso destino final (Suécia) fica adiado até Abril, altura em que o Mar do Norte oferece condições mais favoráveis.
Uma história de Amor no ar, um Oceano Atlântico pela frente e todo um mundo de novas oportunidades que se podem colocar no nosso caminho e mudar, mais uma vez, o rumo das nossas vidas.
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1 Comentário
Fantástica história Maria João! Obrigado pela partilha!